O último verão sem filhos

São as últimas férias de liberdade total. Há que aproveitar para viajar até àquele destino desejado, para dormir noites inteiras, para fazer um jantar bem romântico.

É como naquele filme lindo, Um Lugar para Viver (Away We Go, de Sam Mendes), em que Burt e Verona passam os últimos tempos da gravidez – ela já com uma barriga enorme – em busca do lugar perfeito para o primogénito crescer. Visitam familiares e amigos de diferentes locais, sem medo de viagens compridas – de avião, de comboio, de carron e de autocarro – do calor ou do que quer que seja. No início do filme, no momento em que decidem a partida, Verona espanta-se e deixa Burt espantado com a sua própria constatação: “Podemos ir para onde quisermos…”. O bebé nasce em Julho, por isso, o último Verão sem filhos é passado em viagem, num ambiente de cumplicidade extrema, mas sem nunca tirarem da cabeça o filho que está prestes a chegar às suas vidas.

Será isso que acontece à maior parte dos casais à beira de perder a liberdade de partirem para qualquer lado, quando quiserem, pelo menos com a mesma facilidade. As últimas férias sem filhos tornam-se um misto de descanso forçado (dormir noites inteiras – muitas, todas – é uma boa ideia) e tentativa de aproveitar ao máximo para fazer o que não poderão fazer depois (ficar mais tempo na praia, ler um capítulo de um livro seguido, ter um raciocínio completo seguido…), mas será impossível tirar o bebé do pensamento. Isso é certo.

Será importante ter a consciência de que estas serão as últimas férias com o mínimo de preocupações? Celina Coelho de Almeida, psicoterapeuta e directora clínica da Insight, tem dúvidas de que seja possível: “Parece-me difícil que um casal que está à espera de ter o primeiro filho, consiga ter essa consciência, pois os dois estarão ocupados mentalmente com as questões da preparação da chegada do bebé e emocionalmente focados para esta nova mudança, com muita ansiedade, expectativas e receio. Pelo que fica pouco (ou nenhum) espaço mental para pensar que têm de aproveitar o tempo que resta para namorar”.

É precisamente isso que está a acontecer com Joana Costa. Na véspera de partir para as últimas férias sem filhos, grávida de dez semanas, diz que “ainda não há barriga e já é o centro das atenções”.

As férias estavam marcadas antes do teste positivo, com datas semelhantes às dos anos anteriores. A gravidez veio alterar os planos, mas pouco. “Costumamos fazer uns dias de praia e uns dias de guia na mão, sempre a pensar em aproveitar ao máximo enquanto fôssemos só dois”, conta Joana. Este ano, o objetivo era mesmo aproveitar a praia perto de casa, pensando em, depois, fazerem umas férias mais emocionantes no estrangeiro: uma viagem de carro até à Croácia. A primeira parte calhou bem com a gravidez, a segunda teve de ser adiada para evitar horas e horas de carro. “Assim, talvez vamos a Porto Santo ou Menorca, qualquer coisa perto e pouco exótica”. Nada parecido com a viagem que fizeram a Veneza e a Florença no ano passado. “E vai-me ficar atravessado não termos ido à Islândia enquanto apenas dois.” Para já, a prioridade é o bebé que aí vem, por isso, Joana guardou um terceiro período de férias para Novembro “para tratar das obras no quarto dos hóspedes”.

Margarida Neves não quis perder a oportunidade de viajar uma última vez sem fraldas, chuchas e baby-grows atrás. Grávida de cinco meses, passou uma semana em Cabo Verde, na Ilha do Sal, com o marido. A viagem de avião é relativamente curta (cerca de quatro horas) e é um país tranquilo. Pareceu–lhes perfeito. “Um mês antes falei com o meu obstetra e ele disse que não havia problema nenhum.” Só para se certificar, Margarida ainda perguntou se podia comer marisco, ao que o médico respondeu que “se apetecesse muito podia comer, o risco seriam as intoxicações”. Preferiu deixar camarões e lagostas de lado e comer no hotel e apenas alimentos que não levantassem quaisquer suspeitas. Para fugir a grandes oscilações com uma barriga enorme, resguardou-se também de passeios de camioneta. Nada que retirasse o brilho às últimas férias sem filhos, que só deixaram boas recordações: “Muita praia, muito namoro, deitar tarde e acordar tarde…”. E também algumas recordações cómicas: “A viagem de avião para lá correu normalmente. Para cá, ao fazer o check in deram-nos lugares em primeira classe, porque estavam vagos e porque me viram com um barrigão. Mesmo assim, durante a viagem, apesar de vestir roupa leve e calças de grávida comecei a inchar de tal forma que tive de tirar as calças e vim o tempo todo de cuecas tapada com o cobertor”. Ainda hoje se ri a contar a história.