Um livro baseado num estudo de Harvard traz um pouco de esperança a muitos casais que querem e não conseguem ter um filho.
Parece simples. Um óvulo, um espermatozóide e a vida acontece. A barriga começa a crescer, uns tempos depois o bebé nasce. Mas os caminhos da concepção são misteriosos, sobretudo em tempo de «fast-life« e «fast-food». Estima-se que a infertilidade afecte dez por cento da população portuguesa. O cenário poderá piorar nos próximos anos, profetizam os especialistas na matéria, preocupados com o avanço da idade média das mulheres na primeira gravidez e com o estilo de vida acelerado e pouco saudável dos casais modernos.
Uma constelação de factores interfere no processo da formação do embrião – fisiologia, hormonas e ambiente uterino – mas quem diria que a alimentação também pode desempenhar um importante papel nesta dança de células e emoções?
Diriam as nossas avós, boas conhecedoras das regras da Natureza, mas poucos cientistas lhes deram ouvidos. Até agora.
Um novo livro, «The fertility diet» (A dieta da fertilidade), baseado num respeitado estudo conduzido pela universidade de Harvard – The Nurse’s Health Study – estabelece, pela primeira vez de forma sólida, uma relação entre o que se come e a maior ou menor probabilidade de gerar uma vida. A obra identifica os nutrientes essenciais à concepção, como o ferro e as proteínas de origem vegetal, e destaca aqueles que todas as mulheres devem evitar, como as gorduras trans (gordura artificial presente em muitos alimentos processados).
Qual a probabilidade de o plano dar certo? O livro não diz. Isto porque todas as conclusões são baseadas em respostas a inquéritos, não em resultados de testes efectuados a mulheres inférteis. Contudo, tem o mérito de falar da boa nutrição.
Num artigo publicado na Newsweek no final do ano passado, Jorge E. Chavarro e Walter C. Willet, coordenadores do estudo, não garantem que as mulheres que sigam a estratégia proposta em «The fertility diet» engravidem mais facilmente do que se forem sujeitas a uma fertilização in vitro ou a qualquer outro método de reprodução assistida. Mas destacam as vantagens de se acreditar no poder da alimentação: é uma opção «virtualmente grátis, acessível a todos, sem efeitos secundários e que estabelece as bases de uma gravidez e vida saudáveis».
Insulina e ovulação regular
Por que razão a alimentação afecta a fertilidade, Chavarro e Willet não sabem ao certo. As conclusões apresentadas estão assentes num importante estudo de oito anos que envolveu perto de 19 mil enfermeiras. Uma investigação de longo curso coordenada pela Universidade de Harvard que teve por objectivo avaliar os efeitos da dieta alimentar e outros factores no desenvolvimento de condições crónicas, como o cancro e a doença cardíaca.
«Encontrámos algumas associações estatísticas muito interessantes», afirmou Jorge E. Chavarro ao U.S News. «As mulheres que tomavam multivitaminas contendo ácido fólico, por exemplo, tinham maiores probabilidades de engravidar. O mesmo acontecia com as mulheres que ingeriam altas quantidades de ferro, mas proveniente da fruta, dos vegetais, do feijão ou de suplementos, não da carne vermelha. As gorduras trans, presentes nos donuts, nas margarinas e noutros alimentos processados parecem ter um efeito prejudicial na fertilidade», explicou o investigador.
Os autores de «The fertility diet» acreditam que a saúde reprodutiva poderá estar relacionada com a hormona da insulina e o funcionamento dos ovários. Mulheres com níveis salutares de insulina apresentam maiores probabilidades de ovular normalmente; ao contrário, mulheres com resistência à insulina ou diabetes têm tendência a sofrer de uma ovulação irregular.
E há mais: «Vários estudos, incluindo o nosso, demonstraram que as mulheres que praticam exercício moderado, 30 minutos por dia, são menos propensas a ter problemas de fertilidade e nós sabemos como o exercício melhora os níveis de insulina.»
Chavarro e Willet ressalvam que, por enquanto, as recomendações do livro agora editado destinam-se apenas a mulheres com dificuldades na ovulação. «Não funcionam nos casos em que a infertilidade é causada por impedimentos fisiológicos, como a obstrução das trompas de Falópio.» Nem nesses, nem nas situações de infertilidade masculina, já que o The Nurses’s Health Study não inclui dados sobre os parceiros das voluntárias.
Feijão e leite gordo
Todas as mulheres que participaram no estudo da Universidade de Harvard estavam a tentar engravidar, mas uma em seis relataram problemas em consegui-lo, muitas delas referindo dificuldades na ovulação (um problema relacionado com a maturação ou a libertação dos óvulos). Os investigadores olharam para os regimes alimentares destas voluntárias e das que engravidaram rapidamente, para a prática regular de exercício físico e para outros aspectos relacionados com estilo de vida e compararam os resultados. Várias diferenças-chave emergiram. Chavarro e Willet explicam, no artigo da Newsweek, que essas discrepâncias foram depois traduzidas em estratégias de aumento de fertilidade.
Assim, recomendam que as mulheres que estão a tentar engravidar devem: optar pelos hidratos de carbono de absorção lenta – cereais integrais, feijão, vegetais e frutas – em detrimento dos açúcares rápidos – pão branco, batatas e refrigerantes; banir as gorduras trans do regime alimentar; aumentar a ingestão de proteína vegetal; beber um copo de leite gordo por dia; manter o peso corporal dentro dos limites saudáveis (nem demais, nem de menos) e fazer exercício físico. Todas estas opções estavam fortemente associadas, estatisticamente, a uma maior facilidade em engravidar.